quarta-feira, fevereiro 02, 2011

República das bestas, ou talvez isto seja demasiado actual para ser verdade


Quando comecei a ler a "República dos Corvos"(1988) de José Cardoso Pires (numa edição de bolso de 2010 da Leya e já um dos meus top 10 de 2011), pensei que poderia tratar-se de um romance ao estilo de "Animal Farm" de George Orwell. Na tradução para português, o título, ficou-se pel' "O Triunfo dos Porcos". 

Déspotas, bonacheirões, labregos sem um pingo de piedade e justiça (a Democracia, na verdade, também pouca moral tem para dissertar sobre ela), paradigmas de lavajões a dominar o chiqueiro, a pocilga, como se governa um país. As mãos estão sujas, porque as unhas continuam a esgravatar as terras da Besta (e o contrato com o Diabo é sempre vitalício: há um Fausto em cada um de nós!). E a redoma político-administrativa, sabemos, não cumpre há muito as regras de Higiene e Segurança no Trabalho.

Mas, o primeiro equívoco dessa eventual verosimilhança Pires-Orwell, foi desviado logo no final do primeiro conto que dá título ao livro para, depois, tanto a meio d'"Ascensão e Queda dos Porcos-Voadores" como no final,  com "O Pássaro das Vozes" ter voltado à ideia. 

O que aproxima e distancia os animais dos homens? Tal como Cardoso Pires, George Orwell e outros que se tenham inspirado na animalice humana, e/ou vice-versa, carregamos um bestiário privado. O meu, por agora, e como estivesse precisada de um lápis para sublinhar a maioria dos livros que leio, e tecer ideias e comentários ao lado sobre o assunto (sou pouco bibliófila aqui, pois acho que os livros foram feitos para os mexermos), não por exercício de intelectualidade, mas por necessidade de me transportar dali para outras ideias, voltei ao livro. Sim, voltei. Para encontrar a besta que há em mim, ou a bestialidade da prosa de Cardoso Pires. Depois, a coisa, continua demasiado actual. E quem domina a ironia: domina a criatura.

Sem comentários: