sexta-feira, março 31, 2006

O universo de Pierre Verger

Por Pierre Verger, Salvador da Bahia, Janeiro de 1948

Se o olhar fosse a preto e branco. Sob o olho de uma Rolleiflex, Pierre Verger seria, talvez, um dos fotógrafos que mais contemplou pedaços da vida, da cultura e das tradições do mundo a duas cores. São mais de 62 mil negativos que a Fundação Pierre Verger reúne.
Actualmente está em itinerância uma exposição de 290 imagens do fotógrafo. 70% do material é mostrado, agora, pela primeira vez. Foi no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo que explorei esse universo de Verger, mas a mostra segue agora para o MAM do Rio de Janeiro (30 de maio - 16 de julho 2006); e depois para o MAM de Salvador (3 de agosto - 8 de novembro 2006).
Um viajante solitário que se tornou um marco na História da Fotografia do Brasil. Pierre Verger: francês, nómada, antropólogo, autodidacta. Este fotógrafo contemporâneo apaixonou-se pelo Brasil. Fixou-se na Bahia e durante anos dedicou-se a captar a forma antropológica das gentes. Mais: foi integrado no Candomblé* e foi, de resto, um dos principais responsáveis pela união dessa comunidade religiosa brasileira com a africana (separados por séculos).
* Uma das Religiões Afro-Brasileiras praticadas principalmente no Brasil mas também em países adjacentes como Uruguai, Argentina, e Venezuela.
A religião, que tem por base a "anima" (alma) da Natureza, sendo portanto chamada de anímica, foi desenvolvida no Brasil com o conhecimento dos sacerdotes africanos que foram escravizados e trazidos da África para o Brasil, juntamente com seus Orixás/Inquices/ Voduns, sua cultura, e seus dialetos, entre 1549 e 1888. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Candomblé)

quinta-feira, março 30, 2006

Por Vanessa Rodrigues @
Na "balsa" de São Sebastião para Ilhabela, Março de 2006
Por Vanessa Rodrigues @
IlhaBela, Março de 2006

Por Vanessa Rodrigues @

Na trilha para a Cachoeira do Gato, Ilhabela, Março de 2006


quarta-feira, março 29, 2006

-A inevitável noite de jazz- (Cena II)

( Capa do CD, Comboio, 2006)

Como tudo são sensações, o post anterior foi inspirado no concerto de jazz de ontem. (E não podia deixar de ser. Já tardava um momento de jazz). O espaço: Blen Blen (Jazz Club) - em Pinheiros já a cruzar Vila Madalena. Tudo alinhado. Ambiente sereno. Luz baixa. (Talvez demasiado). E casa vazia pouco antes das 22h. Mas o burburinho anunciava-se minutos depois. Enchia. Afinam-se os equipamentos. Fazem-se as apresentações.
Lançamento do segundo cd do grupo "Comboio". Doze elementos. Mas ontem tocou mais um convidado; da Orquestra de Jazz de São Paulo. Arranjos de Rubinho Antunes. Músicas originais. Outras adaptadas - de Chico Buarque, Nelson Cavaquinho. E em cena o alinhamento instrumental: sax alto, soprano, flauta e flautim, sax tenor, pífano, barítono, flugelhorn, trombone, piano, guitarra, bateria, baixo acústico e eléctrico, percussão (inúmeras variações). E claro, o sentimento. Foi curto. Ritmado. Sensorial. O corpo gostou do embalo.
Quem quiser ouvir pode fazer "download" na página oficial do grupo. Basta clicar no título deste post.

- A inevitável noite de Jazz!- (Cena I)

O samba é de todo o ano. Bossa Nova é de Outono, envolvido em gestos delicados. Juntam-se em jazz, agora. E soa a que cai em mi. E sol que jaz em. Ou que se agarra a si na ausência de que salta o . Chocalham os búzios secos. Embalados pelo tinir dos ferros gementes. Que perdem apenas para um batuque de lamento, desbravado por um piano sonolento. Os pratos tocam-se, e adormecem na percussão. Há um som engolido. Um soar de trompete que aquece o solo do saxofone. Com fôlego. De novo. Incessante. Embala-se a cabeça. Um som de cha cha cha. Momentâneo. Leve. Suave. Lento. E acorda a flauta. Entontecida. Depois recupera o embalo. O silêncio absoluto do ruído aquece a melodia. Um sopro de tchac tchac e ta ta ta. Berimbau sambado. Engelhado até à pauta num andamento subtil. Atonal talvez. E celebra-se em polirritmia. Depois uma síncopa. O enigma da incerteza do fim. Cai em solo de saxofone, de novo. E desliza em mi.

terça-feira, março 28, 2006

Particularidades citadinas

Numa cidade tão movimentada (descontrolada?) como São Paulo já nada surpreende. Mas existem algumas (entre muitas outras) particularidades que a caracterizam: a qualidade do ar; a exploração da mão-de-obra; a marginalidade; os desalojados; e arquitectura exacerbada dos arranhas-céus.
Caminho pela Avenida Juscelino Kubitschek. E avisto um painel: 18h34. Por baixo palavras em ecrã digital: qualidade do ar. Santana: regular. (Então é má, não?). Talvez quando é boa seja regular. Bairro a bairro. Avenida a avenida. A informação é depositada. São letras que se tornam familiares. Desconfio da qualidade vida. (Do ar (irr)respirável?)

Depois, mais à frente, semáforos. Não há prioridade para peões. Passa-se de qualquer forma. Ainda que o peão já esteja a meio da travessia. Não importa. Por isso, nos cantos das passadeiras, para que se alterne as prioridades, estão dois rapazes com grandes bandeiras vistosas (vermelho berrante). Com letras garrafais: PARE. (O nosso stop, pois claro). E é hora de atravessar. Quanto tempo eles lá ficam? E quantas horas trabalham; isso é outra história. O preço da mão-de-obra cá (no Brasil) é uma coisa extraordinária. Barata. Mais baixa que o coloquialmente falado preço da chuva. Entrar numa loja (de centro comercial, por exemplo) é uma surpresa. São mais empregados que clientes. Uma loja pequena. Com espaço para três funcionários, chega a ter sete.

Stand de automóveis. Sábado à tarde. Cinco jovens abanam incessantemente cinco bandeiras com o logótipo da promoção. Quem passa ri. Ou tem pena. Um misto de confrontos cá dentro. (Fico por aqui, por enquanto).
E quanto a intenções? Por cá é, por vezes, difícil perceber/distinguir quem é sério, malandro, honesto. É difícil não desconfiar da capa do livro. É difícil não julgá-lo. É um esforço constante. Será a lei das ruas? Andar desperto. Até porque a intensidade dos contrastes é alta. É que a divergência são as pedras que trilham as ruas de São Paulo. A diferença é o cimento que ergue a urbanidade de Sampa. E, no meio, há costuras que saem da baínha citadina. E que não podem (nem querem) ser remendadas.

segunda-feira, março 27, 2006

Açaí

O açaí é uma palmeira do norte do País. É conhecido pelos indígenas como "içá-çai", a fruta que chora. Sendo típico da Amazônia, espalha-se por toda a região, chegando ao Maranhão, Guiana e à Venezuela.O principal alimento extraído do açaí é o vinho, um suco feito da polpa e da casca de seus frutos.Esse "vinho" é na verdade um macerado com a cor do suco de uvas. Esse suco tem bastantedensidade e é muito apreciado pelos habitantes da região.É energétivo e nutritivo. Os moradores de Belém do Pará o consomem com farinha de mandioca e açúcar.O açaí produz um saboroso palmito que vem sendo industrializado nos últimos anos.Há duas variedades de açaí: o roxo e o branco. O roxo tem polpa cor de vinho.Isso justifica o nome do suco que se extai dessa polpa.Do açaí branco faz se um suco creme-claro.

Primeiro Mês

Não doeu. Não custou nada. Acho que nem me apercebi. E passou assim, a correr. Faz hoje, precisamente, um mês que aterrei em terras do Brasil. Depois de quase 20 horas em trânsito. Depois de uma estafa desconfortante.
Do reportório já constam centenas de histórias e centenas de visões diferentes: sons, cheiros, experiências e, claro, rostos de cidadania que se cruzam no meu (ainda pequeno) olhar.
Passou o Carnaval. Passou Maresias. Ilhabela. Passou uma empresa nova. Passou Mato Grosso do Sul, Espírito Santo; Rosa de Samba; “mininos di rua”; constrastes. Trânsito alucinante. São Paulo cinzenta. Sampa animada. Restaurantes Japoneses (muitos). Litros de Sucos. Atemoyas (que o dicionário de língua portuguesa – Portugal- não identifica). Até Açaí com granola - será que estarei viciada? (é um fruto minha gente!)
Passou a procura incessante (e desgastante) por uma casa nova. A mudança de hotel em hotel. A roupa encorrilhada. A roupa suja sem poder ser lavada. A chuva tropical ao final do dia depois de um sol fabuloso. Mas com calor persistente. E agora é Outono. E o calor continua.
Passou tanto. Que é impossível enumerar tudo e não esquecer nada. Mas mais importante que enumerar o que passou é falar do que fica. E isso posso assegurar. Está tudo gravado. Fica tudo. E ainda (bem que) falta muito!

sexta-feira, março 24, 2006

"Folia de tráfego"

São Paulo tem folia de tudo. Ruídos infindáveis. Corropios. Mar de gente. Cheiros variados. E, claro, como não poderia deixar de ser: folia de trânsito (ou tráfego, no uso local). É difícil encontrar paz nas ruas. Mesmo as vias residenciais acolhem, diariamente, filas de carros intermináveis. Poluição. Confusão (mais do que desorganizada). É a rotina. Mas em São Paulo a folia do trânsito é uma loucura. É mesmo a verdadeira pândega levada ao extremo. Não importa a hora. Se é dia. Se noite.
Em São Paulo, o trânsito acalma apenas no Carnaval. Com as idas para os centros carnavalescos e para a costa. Em Sampa é quase sempre hora de ponta. Sete horas da manhã. Meio-dia. Três da tarde. Oito da noite. Dez, onze, meia-noite! Quatro da manhã. Seis. Sempre!
São carros de um lado para o outro. Ônibus que rolam na via da esquerda, mas que vão enveredar na próxima entrada à direita. Táxis que atravessam carros. Peões desajeitados no meio da rua, enquanto circula o tráfego. Transeuntes que correm de uma calçada para a outra. Rostos abundantes que cruzam. E não se conhecem. Nunca se conhecerão.
Há buzinas que soam, embora não haja volta a dar às viaturas paradas. Ruas de um só sentido que acolhem manobras mirabolantes. Altas velocidades. Um circo recorrente. Histriónico para quem não conhece. Ambíguo. Incerto.
E à noite o ritual comum: passar com o “farol” vermelho. Há lugares onde não se pára. E a vida aqui também não! Corre mais do que acelerada.

quinta-feira, março 23, 2006

Vitória, Espírito Santo, Brasil (Março de 2006)
Vitória, Espírito Santo (Brasil)

"Minino na rua"

Os meninos na rua parecem pequenas formigas que invadem os semáforos com o sinal vermelho. Pedincham dinheiro em troca de acrobacias. Malabarismo. Danças colectivas. O pequeno de pé descalço e rosto farrusco sobe para o dorso do mais velho - pouca coisa. Diferença mínima. Equilibra-se às cavalitas. Bamboleia ainda, mas rápido recupera. Começa a rodar as bolas de ténis envelhecidas, desfiadas, coloridas de verde lima com cinza sujo. O pequeno, por cima, começa o ritual. As pequenas bolas descem às mãos do mais velho. Os dois rodam as três bolas pelas mãos de ambos. Um espectáculo que estamos habituados a vislumbrar, usualmente, apenas nas mãos de uma pessoa. Um palhaço. Um mimo. Um bobo. Um artista. Um malabarista.
Em troca do espectáculo – curto – pedem dinheiro. São 20 segundos de exibicionismo malabarista. Pequena inocência descalça. Consciente! O pequeno salta das cavalitas. Pisa o chão com o pé nu. Corre aos carros em frente, ao lado. Sonda os mais próximos. Alguém dá um real? Os dois dividem-se para angariar. Há trocos nas mãos que saem dos vidros (camuflados) semi-abertos. As mãos despejam moedas. Pequenas notas.
“Oh, garoto, garoto!” Grita ainda uma voz feminina, vinda de um táxi. O sinal abriu. Ficou verde. Os carros arrancam. Cheira a cidade. O garoto ainca corre por uma nota de um real (pouco mais de 40 cêntimos). De perto parece ainda mais pequeno. O rosto mais farruscado. Os pés adaptados ao piso alcatroado. As mãos assemelham-se a pequenos palitos sujos. O sorriso solto. Mas a expressão rude, cunhada. Queimada pelo sol. O tronco nu, esquelético e infantil. Mas o sinal está solto. Deixo-o para trás. Ele fica. O sinal fica de novo vermelho. Vivo. E no passado!

quarta-feira, março 22, 2006

Rosa de Samba

Rosa de Samba é poesia. Sabe a pouco. Sabe a tristeza e alegria e, quem sabe, sabedoria. Rosa de Samba é sentimental. Chega longe cá dentro e alcança, até, aquele rio turbulento. Rosa de Samba é teatro. É Noel Rosa. É uma peça sambada. A primeira em terras paulistanas. Mas a beleza deste texto, da música e da interpretação não está no momento vivido. Está, mais do que isso, na melodia das pequenas coisas: nos simples adereços e no diálogo com o público. O monólogo da actriz facilmente se transformava num diálogo com a audiência. E havia magia. Envolvência, num misto de eloquência que seduzia. A pandeireta foi metáfora. Tudo. Foi máquina de escrever. Bebé mimado. Foi bolsa de mulher. Foi porta batida. Foi até comida. Foi mistério. Ilusão. Em Rosa de Samba até brigadeiros se vendeu. Até “chop” se bebeu. À volta da esplanada do armazém do Centro Cultural de São Paulo. E tudo isto por cinco euros. Sabe a pouco. Ou até mais!
"Com tantas palavras suaves
A única exclusividade
Do meu lusitano idioma
Tinha de ser saudade?"
Cássio Figueiredo, Frugal, São Paulo, 2004

terça-feira, março 21, 2006

-Biscates I-

Ericeu é professor. Mas só em tempo parcial. Pergunta-me se Camões é venerado pelos portugueses. Questiona-me se Fernando Pessoa é um nome conhecido em Portugal. Se é estudado. Se as pessoas o conhecem. "É que na minha terra todos os conhecem. Na minha terra são os expoentes da Literatura Portuguesa. Na minha terra é Literatura obrigatória. Na minha terra ninguém sabe muito de autores brasileiros".
Ericeu licenciou-se em Literatura Luso-Brasileira e Anglo-Saxónica. Mas Ericeu quis tirar outro curso. Estuda Direito. Dar aulas tirava-lhe muito tempo para estudar. E ele queria tanto continuar a estudar. Ericeu faz, por isso, biscate. Dirige táxi. Tira mais ao fim do mês, como afirma. Tem mais tempo para estudar. E dá aulas em tempo parcial. "Mas não compensa", justifica. "Quem sabe no próximo ano vou a Portugal"", diz. "Mas só se continuar no negócio do táxi. A leccionar não dá nem para ter carro".
Estado do Espírito Santo, Vitória

Cidade Paulistana

Sol de sobra. Calor que entranha na roupa leve. Cidade demasiado urbana. Barulhos infindáveis e luzes que nunca se apagam. Burburinho que se transforma em ruído. Cidade que não dorme. Vive de insónia. Acordada ao despertar dos ruídos incessantes. Gira. Rodopia. Contrasta e no meio tem cultura. Tem vida. Tem gente. Tem pobreza. Fausto. Riqueza. Um corropio longo que não se acaba nunca.