quinta-feira, agosto 26, 2010

Devia ter uns 12 anos. A professora pediu que decorássemos um poema de Fernando Pessoa. Lembro-me bem daquela lombada preta e dourada, a imagem de Pessoa a azul, na capa, e o livro denso, paginado a um universo incrível que agora tenho vontade de revisitar. Devo voltar. Preciso, urgentemente de lá voltar, Agora, sim, talvez esteja um pouco mais preparada para o périplo de voltar a ser o Pessoa. Desta vez só o Pessoa, com o mundo todo nele. Com a física quântica a sair-lhe de dentro para se verter em palavras, que são dúvidas; dúvidas que são ponteiros escangalhados, às vezes omissos, outras acelerados como os dos segundos, ou uma espécie de não tempo. 

Era nessa procura-inquieta, nessa dúvida de questionador que encontrava um pouco mais de paz em si e se resolvia com o mundo por um dia. No seguinte, tudo começava. Transformou todas essas dúvidas em criação e, por isso, talvez hoje o conheça um poucochinho melhor. Tenho, assim, essa relação íntima com o Pessoa. Com o Tempo. Que coisa esta de pensar tanto no Tempo. Até porque, falamos a mesma linguagem, que é o mesmo que dizer que a gente se entende direitinho. Até nas dúvidas. Até nas horas mortas, como este poema que decorei sem pestanejar em minutos. Devo tê-lo acabado de ler com vontade de ligar ao Pessoa e dizer-lhe: como foste capaz de decifrar? 


Hora Morta 
                             
                        
Lenta e lenta a hora
Por mim dentro soa
(Alma que se ignora !)
Lenta e lenta e lenta,
Lenata e sonolenta
A lua se escoa...Tudo tão inútil !
Tão como que doente
Tão divinamente
Fútil - ah, tão fútil
Sonho que se sente
De si próprio ausente...
Naufrágio ante o ocaso...
Hora de piedade...
Tudo é névoa e acaso
Hora oca e perdida,
Cinza de vivida 
(Que Poente me invade?)
Porque lenta ante olha
Lenta em seu som, 
Que sinto ignorar ?
Por que é que me gela 
Meu próprio pensar
Em sonhar amar ?

1 comentário:

Anónimo disse...

Por que é que me gela; Meu próprio pensar; Em sonhar amar?

Bonito Princesa!

Bjs Papi