quarta-feira, novembro 30, 2011

Bielman F. sai





Esteve feito ermita num espaço que poderia ser casa, se não fosse caverna. Esteve hibernado no que restava de si, para poder sair. Sempre tinha as sombras. E os espectros são silêncios inofensivos ao olho e nocivos à mente. É que esta feira de vaidades inflige sobre ele um efeito colateral. Chama-se efeito-de-dor e a dor é como carne aberta, ulcerosa, que não cicatriza.

Bielman F. Saiu. Foi ver o povo beber tinto ao fim do dia. Ver as luzes que aumentam a conta de electricidade da metrópole. Devem ter o filamento ardente enquanto há gélido frio ao redor. Enquanto há homens circunspectos no que resta de calor de um cobertor esburacado. É a lente por onde vêem o mundo. E ver o mundo pelo buraco de um pedaço de lã junta, fio-a-fio, é perceber o esfiapado da vida que levam. É encolher-se enquanto os outros passam, de passo feito, frio; em cadência de vida apressada para lado nenhum.

Bielman F. vê isso pela lente inquieta que o encolhe no cubículo que resta. E amarga. Arrasta um certo azedume paro o cinismo. É daí que lhe vem a lucidez. No inquieto e impotente crédito gasto pela incapacidade de trocar na Feira de Vaidades que é a tentativa de uma certa existência.

Como visse e sentisse este pus salivante da carne - social derme - ele encolhe e vagueia, de passo lento, frio, pensante na dor, porque o vento que corta não deixa réstia de sossego para a mente. Mas o sossego da mente pode estar na privação; e privação pode ser apenas privarmos connosco.

Vê-os e não sabe como sair dali. Vê-os e não sabe o que fazer para acreditar; para acreditar que o redor vale o justo, quando é povoado de almas tão parcas e mesquinhas. Bielman F. sai e percebe que este lugar não é dele, sendo; e perde a ideia de onde poderá ser. 


Na impossibilidade de o perceber, por ora, Bielman F. conclui que os espectros reais são mais rasto do que sobra do que aquelas da caverna. Eu poderia ser Bielman F. mas apenas o traduzo.  É que Bielman, sabemos, é um homem esquisito.

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