segunda-feira, julho 12, 2010

Cidade crónica-biónica

“Vai no velório? Estacione aqui”; “Cemitério da Consolação: há vagas”; duas vezes no cartão, taxímetro, tarifa dois: 12,50 reais; mp3: aula de inglês em 19 lições: “O Mundial de 2014 tá chegando, é preciso saber inglês". É preciso saber, dizer, falar, ar. Perder. Argghh: Cidade crónica, vlap: biónica. Corredores acelerados (vruummp), ônibus laranja, verde, azul em céu cinza. Hoje amarelou, ficou blue?, cidade sem filtro-polarizador. Tsssss! 

Táxi Comum-Rádio Táxi, "Banco que dá cultura é do Brasiiiuu"; Itaú, Unibanco, sem banco, no chão dormindo, cai, rebola, pés embrulhados, t-shirts largas em corpo magro, chupado. “Sai Geraldo, deixa passar”; "Cala-a-boca". Leva um estalo, chega a polícia, beijam-se: "não foi nada não". Finge que não vê, não-sabe-não-viu, desconhece, desmerece. “Pára, pegou minha bolsa, pega ela!”; "Não tem jeito, a polícia chega e não faz nada, viu, vai reclamar para quê?: eles se escondem debaixo do viaduto, não interessa". Têm pressa. Vivem por aí, no meio de fumo, no meio de poeira, bebem leite e pão. Roubam para vender. Pegam material valioso. Vai! Ámen!

“Me irrito quando falo de política, não tem como me irritar, tenho 42 anos, sou novo, imagina quando essa gente mais velha que eu o que já viu de malandragem: tá tudo ligado. O Brasil não mudou nada, nada, nada, nada, é fachada”. “Vem Geraldo, segura a sacola”. “Fome, tenho fome”. “Desculpa, pode me ouvir?”. 7961- Apiacás, via Doutor Arnaldo: Passa na Cardoso de Almeida?". "Passa não, melhor pegar na Paulista” “Vai me revista, não tenho nada não”. Sacolão das artes, teatro de rua, ensaio na calçada: A Bolha, fazemos todos parte dessa bolha, splashh, me pega. "O arroz e o feijão aumentaram de preço, como a gente vai fazer para sobreviver?". "Diz para ele que os produtos melhores vão todos para exportação e que a gente só fica com os restos, fala-fala-ahahahahahahaah! "Ele falou que todo o mundo começa comendo arroz e feijão como parte de uma dieta alimentar equilibrada, para um dia poder comer algo melhor... E, agora, que essa bolha está construída, onde a gente vai trabalhar? Fala para ele, que vai ser preciso alguém ficar bombeando no subterrâneo e que vamos pagar para ele ainda menos do que pagávamos: ahahahahaahah!" "Ele falou que o mercado está aberto a novas possibilidades de trabalho e, com o crescimento do Brasil, haverá um mundo melhor à sua espera..."

Jacarandás em cemitério, cemitério com vagas, velório com estacionamento, zlap, acelerar. Ambulância, sinfonia, bolhas, bolhas, clero, nobreza, monarquia, autocracia, consumo, insumo, desuno, agrego para desagregar, congrego, invejo, inferno, anseio, regateio, parcelo; parcelo a vida para que não se vá de um zás. “Cemitério da Consolação: há vagas”.   

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