A frase não é minha. Roubei-a de uma aula de Literatura sobre exílio, mas achei conveniente que, à procura do slide certo, A.P. a tivesse dito sem pensar na carga simbólica do contexto.
Pareceu-me muito conveniente que a tivesse disparado, gracejando, enquanto discutíamos autores à procura de si, desenraizados, arrancados da pátria por razões extremas, vivenciados na dureza degenerativa dos campos de concentração; regressados e sobreviventes mudos, silenciosos e, cronicamente, incomunicáveis pelo vazio da experiência exilada, quando a condição humana, parece, dizem "os especialistas" (o famoso cliché actual da imprensa que nada significa, pois ninguém vai averiguar que universo amostral de entendidos é esse, quando podem ser apenas meia dúzia: a mesma meia dúzia de planos de corte errados, quando usados na manipulação cinematográfica, quem sabe) é toda ela um desterro.
Desenraizamo-nos de nós, pelos outros, por nós próprios, ou estamos desconexamente desviados do lugar onde vivemos, dos valores que não partilhamos, da rejeição que, às vezes, nos é auto-imposta.
"Estou a descobrir para onde vamos" é lírico numa aula sobre exílio, cria desconforto, porque demasiado invasivo, como se me levasse ali também carregada, sem que eu o tivesse pedido, sem que eu me desse conta que, da mesma forma, eu ia ali embarcada, sem náuseas do mar atribulado, procurando uma ilha comum onde pudéssemos descansar do balanço para discernir a resposta. Encontrar coordenadas comuns para problemas diversos.
Ali, nós, igualmente, íamos meio náufragos, como um Caim peregrino do Saramago, constantemente exilado, como se o sufoco do enraizamento fosse, porém, um limite para ele ser, para ele cumprir uma missão quase fenomenológica para convir uma certa neurobiologia da consciência: Penso, sinto (sou, acrescento), logo existo.
Por isso, Caim tem sempre de partir. E se, por um lado, nessa equação cartesiana a que António Damásio acrescentou o afecto "sinto", o "sou" dá-se, conjecturo, quando vivemos segundo preceitos que nos fazem sentir liberdade nas veias.
Ocorre-me isto e, a propósito de "estou a descobrir para onde vamos", o Saramago ensaia uma resposta em "A Memória do Elefante" - sendo o paquiderme também ele, uma espécie de exilado. "Sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam." É para aí que vamos!
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