Sempre que eu aparecia para um café ao fim da tarde a senhora de cabelo curto perguntava-me:
-A menina já voltou do Brasil? Como tem sido lá?
E depois trazia-me o café e a fofa Clarinha para acompanhar, que eu degustava sempre com a mesma lentidão de quem prova pela primeira vez. Lugar exíguo, espelhos empoeirados, ferros oxidados, vitrines a esconder garrafas de vinho do Porto e o whiskey nunca abertos e que, com certeza, o tempo e o ar avinagraram. Havia aquele som metálico das moedas na máquina registadora, uma cadência hipnotizante e que remotamente nos transportava para tempos onde a polifonia dos telemóveis não era sequer uma possibilidade. Sentia-me em casa, por ali. Abria o caderno e ficava a ouvir, numa bisbolhotice quase imposta pelo pouco espaço daquele lugar familiar. Cumprimentava sempre o senhor de óculos fundo de garrafa à entrada, mas ele nunca me reconhecia. Era simpático por natureza. Um olá menina não chegava a ser indiferente, mas era gratuito e relativo. Pairava no ar. A certa altura, em tardes com mais calma, ficava a saber a vida de uns e outros. Que a velhice é um estado de auto-comiseração para uns; um estado precoce para outros, uma simpatia para outros. Deixava-me estar. Agora que faço as contas, faz mais de dois anos que não lá vou. Há uns meses tentei levar várias pessoas aquele canto especial no centro do Porto, mas deparei-me sempre com o mesmo bilhete na porta: "Fechado por motivos de saúde". Não consigo perceber que doença prolongada será esta que acometeu o Rei dos Queijos. Anda esquecido, faz-me falta, faz falta ao Porto.
4 comentários:
Vanessa, também adorava o Rei dos Queijos! E também fiquei desolada quando lá vi o mesmo bilhete... Era o meu spot antes de embarcar nas viagens de regresso de comboio, ao fim de semana... Aquelas queijadinhas...aquele cheiro tão característico..e o mesmo senhor de óculos, já envelhecido, de passo lento e compenetrado. Faz, sem dúvida, muita falta! O que será que aconteceu..?
Também sinto a falta deste estabelecimento sempre recheado de produtos de boa qualidade. Era ali que comprava o afamado bolo de Margaritte, o Queijo da Serra que era único e que não encontro em outras casas da especialidade.
Mas o que se passa com o Rei dos Queijos?
Faz muita falta ao Porto e ao turismo que aqui passa e olha para a montra e não vê nada.Vinha do Brasil todos os anos e este era lugar obrigatório para o lanche da tarde e para as compras tradicionais do Queijo Nevada, de sabor único, o bolo de Margaritte, a morcela da beira. Eu levava de volta para o Brasil. Nao vejo representação desses produtos. Me informaram que era na rua das flores, mas eu fui e não encontrei.
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