sábado, julho 20, 2013

Receita para ser feliz (e sopas coloridas)

1. Nunca me dei bem com receitas. Acabo sempre por adulterar as gramas de açúcar, de sal, de arroz, eu sei lá. É por isso que gosto de inventar na cozinha. Há-de haver, com certeza, algum estudo, tese, teoria filosófica, especulação ancestral hermeticamente enquadrada na transdisciplinariedade de convergência de algum "-ismo" ou "-logia" que comprove que cozinhar é uma extensão da forma como encaramos a vida. Surge-me esta filosofia de botequim enquanto faço sopa. A minha sopa nunca fica da mesma maneira, porque nunca compro os mesmos ingredientes e até gosto de inventar. Lavo a louça e apercebo-me de que, na vida, sou um pouco assim. Procuro sempre maneiras de fazer diferente e irritam-me as regras quadradas, a hierarquia e a mediocridade. Mas isso é outra história. Alinho tudo isto num axioma doméstico enquanto ponho o resto do detergente com água no esfregão, desengordurando a panela. Será que cozinhar revela realmente muito sobre nós? O que diria Freud, Lacan, Piaget, Jung e Alfred Adler e sua psicologia do desenvolvimento individual? Será que deveria convidá-los para jantar? Que prato servir?

2. Uma das coisas que tenho aprendido para ser feliz é não dar demasiada importância ao passado e às pessoas que eu deixei que me magoassem. A idade da ingenuidade já passou e um dia temos de aprender a dizer não e sair a tempo, antes que a areia movediça nos sugue a força. Outra coisa é dançar no meio da sala, descobrir uma música nova todos os dias, encarar o dia sorrindo, fazer bolas de chiclete e rebentá-las, tirar os sapatos e encarar a areia da praia no Inverno, fazer surpresas a quem gostamos, mandar mensagens estapafúrdias aos amigos com fotografias ridículas, saltar no colchão da cama. Enfim, não levar a vida tão a sério e não deixar que aqueles que a levam nos pesem com sua indiferença e julgamento. Outra delas é fazer sopas coloridas, e bolos com açúcar a mais, mesmo que as teorias da Gestão e dos Recursos Humanos digam que deveria ser mais coerente na minha forma de cozinhar. Gosto de deixar a vida mais cromática e de a tornar doce. Pode ser que Freud assim explique.

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