Há momentos num percurso de vida em que temos largar as coisas (atenção: ironia). As fraldas, a chupeta, as bonecas, os carrinhos, os berlindes, as papas, as chicletes gorila, as cassetes, enfim, extensões de nós que deixam de fazer sentido, que se perdem no éter do nada, no vazio. Extensões de que perdemos o controlo. Há, realmente, extensões de nós, às quais podemos nunca mais ter acesso, embora nos pareçam imortais e eternas, naquele exato momento em que vivemos.
Tudo isto poderia não me ter acometido se não tivesse percebido que a maioria dos meus alunos deste ano tem uma conta hotmail. E isso funcionou como uma espécie de mnemónica. Aos 18 anos criei a minha primeira conta de e-mail no serviço hotmail. Achei que mais ninguém usasse hotmail. Quis voltar a ela, rever o lixo que por lá poderia andar e nada. Não me ocorreu que o ano passado a Microsoft se apoderou de todas as contas inativas e pluff. Zerou. A minha primeira conta nunca existiu, portanto, devido a um processo de extermínio. E essa conta foi tão física quanto os quilómetros de palavras e e-mails que por lá deixei. Para onde foram as palavras? Para onde foram as fotos, os vídeos, enfim, para onde foi o virtual, a lógica formulada na equação de zeros e uns que existiu? O universo cibernético é esse nada virtual que pode entrar em crise existencial. O nada pode implodir. Percebi que como já não ia a tempo mais valia esquecer o assunto.
Minutos depois, contudo, ocorreu-me que também tive um endereço eletrónico do Portugalmail. De imediato, fui confirmar, recordei-me da senha e entrei para um universo de milhares de e-mail por ler. Resolvi pôr um fim ao caos e vaticinar o fim da conta. Recebi um e-mail para confirmar a ação de carrasco implacável. Hesitei, mas segundos depois, dei luz verde. Voltei ao processo de pensamento em cadeia e recordei-me do Hi5. Não consegui entrar: o e-mail de acesso ou era o hotmail, ou o portugalmail. Confesso, não doeu. Foi uma coisa natural, como as fraldas, nem damos por nada. Desapego, deve ser isto.
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