quarta-feira, maio 06, 2009

Só voltaram para casa

Augusto Boal e agora o poeta Mário Quintana. No fundo, eles só voltaram para casa. Nisso sou muito "chapliniana". Que a vida pode terminar em "rewind", apenas e somente como se de um orgasmo se tratasse. E estes senhores, que nestes últimos dias a imprensa diz que se foram, eu sei que gozaram esta vida da melhor maneira. E eu admiro os homens que não têm medo de o ser. A obra de Boal conhecia de perto, porque fiz Teatro do Oprimido. A de Mário Quintana ainda sou pequena para o desfrutar como merece...Pelo menos apanharam o comboio juntos e cumpriram o velho sonho de infância.

POEMA DA GARE DE ASTAPOVO

O velho Leon Tolstoi fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!
Com certeza sentou-se a um velho banco,
Um desses velhos bancos lustrosos pelo uso
Que existem em todas as estaçõezinhas pobres do mundo
Contra uma parede nua...
Sentou-se ...e sorriu amargamente
Pensando que
Em toda a sua vida
Apenas restava de seu a Gloria,
Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas
Coloridas
Nas mãos esclerosadas de um caduco!
E entao a Morte,
Ao vê-lo tao sozinho aquela hora
Na estação deserta,
Julgou que ele estivesse ali a sua espera,
Quando apenas sentara para descansar um pouco!
A morte chegou na sua antiga locomotiva
(Ela sempre chega pontualmente na hora incerta...)
Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho,
E quem sabe se ate não morreu feliz: ele fugiu...
Ele fugiu de casa...
Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade...
Não são todos que realizam os velhos sonhos da infância!

Mário Quintana

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