terça-feira, abril 28, 2009
Luxúria...
Estava longe de “abismar-me”, do ruborizar do “embaraço” e bem distante de qualquer probabilidade remota de “ascese”, quando o livro de Roland Barthes “Fragmentos de um discurso amoroso” (1977), na estante do 11º andar com vista para o Museu de Arte de São Paulo, onde moram Anna Ullic, Lorac Ahnisuol, Mu e MadMax começou a magnetizar-me. Claro: num desses olhares lascivos e com segundas intenções que só livros com uma certa maturidade e sabedoria sabem fazê-lo a miúdas despreparadas, como eu, para digerir o que é o Amor, afinal, sobretudo quando ela está acabada de aterrar à cidade que é, essencialmente, o Amor Líquido de Zigmunt Bauman levado ao êxtase.
Folhei-o, portanto. E lá encontro Racine, Freud, Werther, Jung, Sade, Stendhal, Nietzche, Baudelaire e mais uma série de falhados no amor, mas com muita classe e sapiência na arte da orgia, qualquer que ela seja – e desta leva Sade é mestre na cantilena. São outros tempos, pensarão alguns. Mas eu digo, que não. Os "tempos" são, sensivelmente, os mesmos. As neuroses é que são mais crónicas, porque muda a nossa vontade de transmiti-los. Os meios. E nós recalcamo-nos, por isso. Os mesmos animais amorosos individualistas com medo de saber que a intensidade dos laços valem mais que os desafectos e o medo de peito amargo, pesado, rasgado por nadas.
Saibam, então, o que Barthes tem para nos dizer de palavras como estas, baseando-se nas entrelinhas de alguns dos autores desta história.
Abismar-me. Me abismo, me sucumbo. Lufada de aniquilamento que atinge o sujeito apaixonado por desespero ou por excesso de satisfação. Sartre: desmaio para escapar a esta compacidade.
Catástrofe. Crise violenta no decorrer da qual o sujeito, sentindo a situação amorosa como um impasse definitivo, uma armadilha da qual nunca poderá sair, se vê fadado a uma destruição total de si mesmo.
Cena. Troca de contestações recíprocas. Sade: A cena é luxuosa, ociosa- tão inconsequente como um orgasmo perverso: ela não marca, não suja. Paradoxo: em Sade a violência não marca – o corpo é restaurado constantemente.
Carta- A figura visa a dialéctica particular da carta de amor , ao mesmo tempo vazia (codificada) e expressiva (cheia de vontade de significar o desejo).
Desrealidade. Sentimento de ausência , fuga da realidade experimentada pelo sujeito apaixonado, diante do mundo..
Louco. O sujeito apaixonado é atravessado pela ideia de que ele está ou está a ficar louco.
Querer- Possuir. Ao compreender que as dificuldades da relação amorosa vêm do facto de que ele está sempre a querer se apropriar de um modo ou de outro do ser amado, o sujeito decide abandonar a partir de então todo “querer-possuir” a respeito dele.
Em Wagner p. e.g. "O outro deve-me aquilo de que preciso".
Rapto. Episódio tido como inicial para o sujeito ser capturado e encantado. Freud chama-lhe efeito hipnótico.
Saídas. Soluções enganososas, quaisquer que sejam, que dão ao sujeito apaixonado um repouso passageiro, apesar do seu carácter quase sempre catastrófico; manipulação fantasiosa das saídas possíveis da crise amorosa.
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