Ainda não encontrei o destino de abrigo. Talvez a ideia essencial seja continuar como andarilha, sem encontrar as soluções que estou sempre à procura! Um pai-de-santo uma vez disse-me, sem me conhecer, que não preciso procurar tanto. Que as coisas virão simplesmente!E que a caminhada ainda é longa! Não me perguntem se acredito. Já disse muitas vezes, no que toca a religiões, que não acredito em nada a não ser nos encontros espontâneos; nos abraços prolongados e nas viagens improvisadas. Há qualquer coisa de mágico quando ponho a mochila às costas e me deixo levar! Por isso, tenho saudades das viagens andarilhas. Como estas:
"O que mais deixei para trás, em cada viagem que fiz, foram os amigos que não voltei a ver. Amigos verdadeiros, instantâneos, instintivos, amigos do peito, para toda a vida. Cá dentro, sou português macambúzio, fechado sobre mim mesmo, frequentemente de mal com Portugal e com os portugueses. Lá fora, sobretudo viajo sozinho, sou um homem novo, sem destino, sem passado nem futuro: apenas o tempo que passo. E assim, porque sou verdadeiramente livre e desconhecido, acontece-me frequentemente tornar-me íntimo amigo de pessoas que acabei de conhecer há meia dúzia de horas. Tudo é genúino e generoso nesses encontros e, quanto maiores são as diferenças, mais evidente se torna o essencial entre as pessoas. Não esperamos nada uns dos outros, apenas o privilégio de viajar juntos, beber uma cerveja juntos, ficar à conversa por uma noite adiante.
Disse-me uma vez, numa dessas constrangentes despedidas, um amigo sarahui: "Os que não morrem, encontram-se." Mas aprendi que não era verdade, infelizmente. Quando muito, poderia talvez acreditar que os que se encontram nunca mais morrem na nossa memória. Mesmo que apareçam tão-somemente assim, esporadicamente, do fundo de uma gaveta, onde vive, a luz dos dias felizes."
Miguel Sousa Tavares, "Sul"
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